A cimeira de Gaza é “um dia extraordinário para o Médio Oriente”. Donald Trump disse isto ao assinar o acordo de paz para Gaza em Sharm el Sheik. Pouco depois foi a vez do presidente egípcio al Sisi, com quem co-preside a cimeira egípcia sobre o futuro da Faixa, do presidente turco Erdogan e do primeiro-ministro do Qatar, todos países mediadores do acordo. O público deu uma salva de palmas. “É um dia incrível para o Médio Oriente, demorou três mil anos a chegar aqui”, acrescentou.
«Hoje é talvez o dia mais lindo dos últimos dois anos»: Roni repete com um sorriso que se percebe mesmo à distância, num dia que para muitos cidadãos israelitas marca o regresso à esperança e à vida. Nestes longos meses Roni viveu suspenso entre lembranças e expectativas. Tem 27 anos, ítalo-israelense, nascido em Roma, mas há sete anos em Tel Aviv, onde trabalha em projetos colaborativos entre os dois países. E a sua vida ficou para sempre entrelaçada com o massacre de 7 de outubro de 2023, quando o seu tio Shlomo Mantzur foi raptado pelo Hamas no kibutz Kissufim, na fronteira com a Faixa de Gaza. Ele era o refém mais velho de todos.
«Meu tio tinha 85 anos. Ele vivia no kibutz Kissufim, uma comunidade mesmo na fronteira com Gaza”, diz Roni, com a voz pesando em cada palavra. Shlomo nasceu no Iraque, numa família judia. Em 1941 conseguiu salvar-se do massacre de Farhud, fugindo de Bagdah em direcção a Israel. casa dos tios, atirou lá dentro e levou os dois. Minha tia conseguiu escapar, mas meu tio foi levado para Gaza”, conta Roni que estava com a avó em Tel Aviv naquela manhã, durante a celebração do Simchat Torá, quando as sirenes começaram a soar.
«Corremos para o bunker. Minha avó tentou ligar para a irmã, que atendeu apenas 48 horas depois, quando a equipe de resgate a salvou. Foi ela quem nos contou que meu tio havia sido sequestrado”, explica. Durante mais de um ano a família viveu na incerteza. Depois, em fevereiro, veio a notícia: “O corpo do meu tio foi devolvido durante uma das trocas entre Israel e o Hamas. A análise mostrou que Shlomo morreu nos primeiros dias do sequestro: “É triste dizer, mas para nós foi um alívio saber que ele não sofreu por muito tempo nos túneis do Hamas”. E depois “para a nossa religião o enterro é fundamental, e recuperar o corpo foi muito importante”.
No dia da libertação e do retorno, Roni olha para as imagens dos demais reféns agora libertados com uma emoção reprimida: “É talvez o dia mais lindo dos últimos dois anos, porque vinte reféns voltaram para casa depois de terem vivido um inferno”. Depois pára e acrescenta: «Precisamente pela história do meu tio entendo como é importante que as famílias recuperem até mesmo os corpos dos seus entes queridos. É uma questão de dignidade, de paz, de encerramento.” No dia em que Israel respira aliviado, as palavras de Roni lembram uma dor que não pode ser apagada. As palavras de quem ainda consegue partilhar a alegria dos outros, apesar de não ter novamente quem abraçar.